1 de agosto de 2008

A importância das Divisões de Base

No financeiramente combalido futebol nacional as divisões de base assumem um papel crucial no sucesso de uma equipe.

Tradicionalmente o Palmeiras não dá atenção à formação e revelação de jogadores. No passado isso era resolvido com boas contratações nos celeiros de jogadores que eram as equipes menores. Tempos em que era possível trazer Dudu e Nei da Ferroviária-SP, Luis Pereira do São Bento-SP ou ainda o eterno Divino do Bangu-RJ. Também, naquele tempo, havia mais espaço para contratar jogadores de equipes mais tradicionais como César do Flamengo-RJ, Leivinha da Portuguesa-SP ou Zeca do Grêmio-RS.
Porém estes tempos acabaram. Por falta de instrução os jovens jogadores caem desde muito cedo nas mãos de empresários e o futebol mais globalizado se encarrega de encarecer e atrair os que se destacam.

De fato desde a aposentadoria do Divino o Palmeiras só voltou a conquistar títulos com a inicialmente saudável parceria com a Parmalat que injetou recursos para conseguir trazer os jogadores que o time precisava. E é sintomático que depois da saída da Parmalat o time só volte a conquistar outro título com nova parceria que reforçou a equipe com talentos como Diego Souza e Henrique.

Nestes mais de 30 anos pós-Divino o clube conseguiu ter apenas 2 boas equipes (safras) de base. Uma ainda no final dos anos 70s que tinha, entre outros, Pires, Sotter, Edson, Pedrinho, Mococa, Silvio, Macedo, Carlos Alberto Seixas, Adauto, Biquinha. Porém pouco espaço foi dado para eles, e mesmo os mais destacados – Pires e Pedrinho – foram misteriosamente vendidos para o Vasco da Gama. A outra boa equipe só veio a materializar-se no começo deste século, revelando jogadores como Cavalieri, Bruno Cardoso, Glauber, Francis, Alceu, Vagner Love, Edmilson, Franklin (falecido), Diego Souza. Novamente, muitos não tiveram espaço, ao passo que outros foram rapidamente vendidos. A fantástica dupla Edmílson & Vagner Love não durou 6 meses, pois o primeiro foi para o Japão. Passados mais 6 meses foi a vez de Vagner Love ir para exterior. Ou seja, além de revelar poucos talentos, o Palmeiras não proporciona espaço para eles no time profissional, e os poucos que ultrapassam este obstáculo são rapidamente vendidos, sem potencializar seu retorno competitivo e financeiro para o clube. Os casos mais recentes de Paulo Assunção, Taddei, Elias e Ilsinho são outros exemplos disso. Paulo Assunção saiu por uma ninharia (os jornais na época falaram de US$350 mil) para ser destaque no super-campeão Porto de Portugal, Taddei saiu de graça para brilhar no Roma-ITA, o mesmo aconteceu com Elias e Ilsinho. Sendo que Ilsinho, menos de um ano depois que saiu do Palmeiras, foi vendido por 11 milhões de euros, valor igual as atuais dívidas do nosso clube e mais do que o Palmeiras hoje pede por Valdívia.

O Palmeiras precisa encarar as divisões de base como seu principal investimento para seguir seu caminho de glórias independentemente dos riscos que trazem uma parceria. A contínua revelação de jogadores não somente aumenta a competitividade da equipe, como também é crítica para o seu equilíbrio financeiro. Pratas-da-casa minimiza o dispêndio de trazer jogadores de fora e, principalmente, constituem-se em vital fonte de recursos, pois os jogadores, junto com o imobilizado, são o principal ativo financeiro de uma equipe.

Mas o que acontece? Porque o Palmeiras não resolve este crônico problema?

Uma recente declaração do nosso ex-goleiro Sérgio esclarece parte do problema. Ao ser perguntado como o Palmeiras revela tantos bons goleiros ele disse o seguinte: “Desde quando eu entrei, sempre foi uma posição valorizada. Tem muita tradição no clube. Já teve Leão, Oberdan Cattani, Velloso... Sempre revelou bem os goleiros que fez em casa. E revelou porque faz um trabalho sério. O Pracidelli não aceita isso de contratar goleiro nem agradar o treinador e colocar o filho dele lá. Só fica se for bom, lá o empresário não tem vez. E é uma competição muito acirrada.” (ver postagem de 12/Junho/2008).
Por essa declaração, de quem viveu de dentro a questão, vemos que, nas posições de linha, se dá mais importância em atender os desejos de empresários e pistolões inescrupulosos do que lapidar talentos.

Outra indicação de onde está o problema foi dada involuntariamente em declarações de Leão e Luxemburgo. Em uma oportunidade Leão precisou urgente de um zagueiro e utilizou Thiago Gomes, então com 23 anos e jogando no Palmeiras B, que teve boa atuação. Entrevistado após o jogo Leão confessou que apesar de ser técnico da equipe por mais de 6 meses desconhecia a existência do Thiago Gomes. Alguns meses depois Leão indicou a contratação do lateral-direito Amaral sem nunca dar oportunidade ao Ilsinho. Porque o técnico do time profissional desconhece e/ou não dá espaço aos pratas-da-casa? Mais recentemente, Luxemburgo comentou com repórteres que os times da base deviam jogar com menos volantes e sim mais atacantes e meias. Passado alguns meses os repórteres perguntaram como estava aquela questão a qual Luxemburgo respondeu que não “tivera tempo para falar com a comissão técnica da base”. Como um técnico que possui uma comissão técnica de quase 40 pessoas não encontra tempo para conversar com os responsáveis das bases do seu próprio clube?
Estes episódios indicam que há dois Palmeiras independentes: o profissional e o de base. Estes dois Palmeiras demonstram que não se falam e parecem até serem antagônicos. É como se houvessem “due famiglie” distintas, cada uma explorando e defendendo seu território.

Incompetência parece ser outro problema. As pessoas que deviam fazer a ligação entre profissional e base, ou seja, Toninho Cecílio, Saverio Orlandi, Gênero Marino dão seguidas demonstrações de estarem em outra página. De fato até parecem serem uma outra ramificação das “famiglie” com interesses próprios. Ao menos essa é a impressão que passa ao ler nos jornais como defendem as contratações de jogadores como Max, o paraguaio Fretes e Claudio Valdivia. Será que estas negociações foram discutidas com as comissões técnicas das bases ou profissional? Porque eles não fazem Luxemburgo e as bases se falarem? Porque Cecílio colocou inexperientes conhecidos seus – os ex-jogadores Jorginho e Betinho – na comissão técnica das bases? Porque eles trazem um volante de fora – Souza emprestado pelo Dom Bosco-DF – e obrigam um dos poucos destaques do sub-20 – o também volante David – a jogar de lateral-direito como ocorreu no último fim-de-semana?

Se falta competência para gerenciar a ligação Profissional e Bases, o que dizer dos que gerenciam as bases? Desde o ano passado apenas 4 caras novas estrearam no time principal: David apresenta alto potencial, Mauricio vem tendo algumas oportunidades e, finalmente, Marquinhos e Beto entraram em um par de partidas e foram embora. No ano passado o sub-20 conseguiu a proeza de ficar fora na primeira fase do regional da categoria ao ser último no seu grupo de 6 times: Votoraty, São Bento, Sorocaba, Guarani e Ituano – em dez jogos conseguiu perder oito e empatar uma vez. É muito pouco para as divisões de base de uma equipe de primeira grandeza como o Palmeiras.

Os próprios torcedores tem sua parcela de culpa, pois demonstram uma impaciência muito grande com os jogadores promovidos das bases. O último exemplo foi Willian. Ele era o grande talento das bases até ficar dois anos parado por causa do problema cardíaco. Quando voltou chegou a ter um bom começo no regional do ano passado, mas depois de uma contusão caiu de rendimento e a torcida logo começou a pegar no seu pé. Será que deveríamos ser mais pacientes com ele? Será que Denílson ou Lenny estão fazendo mais do que ele fazia? Recentemente o ex-técnico alemão Klinsmann associou o jovem talento a uma flor que “se não desabrocha tende a morrer”. Será que nós torcedores estamos dando o suporte que nossos pratas-da-casa precisam para atingirem seu potencial?

Conflito de interesses? Falta de comunicação? Incompetência profissional? Falta de transparência? Impaciência descabida? Aparentemente uma mistura de tudo isso de ruim vem prejudicando o sucesso do Palmeiras.

Atividades como novo refeitório e convênio de ensino para os meninos são excelentes, mas longe de ser o suficiente. São mais obrigações morais que medidas de efetividade competitiva. Retomar as divisões menores – sub-13 e sub-11 – também foi uma medida muito acertada e esperamos que traga frutos no futuro, e que não seja apena para proveito dos empresários e divertimento dos filhos de associados do clube. É preciso mais. É preciso um trabalho conjunto do profissional com as bases, que as bases sejam foco de investimento, que a meritocracia e lisura guiem os trabalhos, e que pessoas competentes sejam postas no comando. Tudo isso parece óbvio, mas o óbvio não está acontecendo. E os pífios resultados das bases demonstram isso.
Foto: Romarinho, uma das atuais promessas das bases